O texto que segue, traz uma feliz amostra da arte de
escrever, e nos põe em contato com uma mulher que lida com a escrita de
forma brilhante – a jornalista portuguesa Eduarda Freitas:
Ando a procura de um
pequeno céu para alugar. Um céu sem grandes luxos, uma coisa simples, não muito grande, onde caiba uma pessoa nem gorda nem magra: eu.
Um céu com vistas para cima, mais para cima, para cima de cima. Não
tenho preferência pela cor. Pode ser um céu pintado de azul, mas, também pode
ser pintado de cor-de-laranja-fim-de-tarde ou de
preto-cor-de- boas-noites ou quase-branco- de-nuvens-aos-molhos. Um
céu sem divisões obrigatórias, qualquer coisa como um open space,
com espaço suficiente para me esticar ao sol.
Gostava também que tivesse um
pequeno jardim, ou uma varanda, para plantar estrelas. Dizem que as estrelas,
no céu, são boas de cultivar e dão luz em pouco tempo. Percebo
pouco de céu-cultura, mas para isso é que servem os livros com ensinamentos, e
como penso seriamente em dedicar-me a esse tipo de ofício, tenho andado a ler
diversos textos de cultivadores de palavras, que explicam direitinho a altura
do coração em que as estrelas dão mais luz.
Espero
aprender alguma coisa nos próximos tempos, aprender de verdade, porque pelos
vistos é preciso muita dedicação. O
céu que ando a procura, para alugar, não precisa ter aquecimento central. Muito
menos global. Quero um céu que seja bem local. Fácil de localizar até na palma
da mão. Para receber o mundo sem sair do céu. Estico a toalha e faço de todos
os dias fins de tarde. Para que seja sempre cedo e tenha sempre tempo para o
tempo. Que até pode chover que eu não me importo. Sou uma Maria vai com o
vento.
A
minha única exigência é que os vizinhos dos céus ao lado ou acima, não reclamem
se alguma clave de sol lhes for tocar à porta, ou algum balão de risos subir
tão alto que bata no tecto do meu céu que pode muito bem ser o chão deles.
Temos que ser uns para os outros.
Eu
– inicialmente – até pensei em comprar um céu pequeno, um céu que depois
ficasse mesmo para mim. Mas hoje em dia um céu comprado fica muito caro. E
depois há os bancos que pedem este mundo e o outro por um simples pedaço de céu
e esquecemos a vida toda a paga-lo.
Eu
pensei pouco e decidi que preferia alugar. Até porque se me fartar do meu
espaço, alugo outro céu. É só juntar as estrelas e virar a lua ao contrário.
Não há compromissos com bancos. Só com bancos de ar. Que fazem tremer a
barriga.
Tenho
andado numa agitação: já fui a várias imobiliárias e até procurei na internet,
mas só me aparecem céus-de-faz-de-conta. Desses, conto eu vários. Se por acaso
alguém souber de um céu – que até pode ser usado – para alugar, diga-me, por
favor.
A
minha morada (para já) é: Rua na Terra, 100 número.
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Fonte Imagens:
Casa - Can Stock Photo – www.cnstockphoto.com.br/foto-imagens
Eduarda
Freitas – www.advivo.com.br/re--fora-de-pauta/19968Nota: As imagens publicadas neste blog pertencem aos seus autores. Se alguém possui os direitos de uma delas e deseja que seja removida deste espaço, por favor entre em contato com vrblog@hotmail.com
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