Vanise Rezende - clique para ver seu perfil

HISTÓRINHAS DE CRIANÇAS

13 março, 2014


Artur, meu neto, chegou pra ser feliz na vida. É assim que o vejo, agora com três anos, enquanto ele vai distribuindo suaves momentos de alegria e cuidados. Seus interesses passeiam pelas trilhas de uma exuberante imaginação, capaz de encontrar o que for necessário para subsidiar a brincadeira da vez: se faltar gasolina, basta seguir adiante com o carrinho, para encontrar um posto e abastecer; se o dinossauro estiver com fome, lá vai ele a um canto qualquer da casa e volta com as mãos em concha trazendo o que precisa... 

Como outras crianças da sua idade, Artur gosta muito de assistir, como ele diz quando quer ver os vídeos de seu interesse, tais como a ‘Galinha Pintadinha’, ‘Os ‘Três Porquinhos’ e ‘Dora Aventureira’, que já tiveram o seu tempo de glória. 

Em geral nossa preocupação maior diante da criança em desenvolvimento é educá-la para a vida, da melhor forma que a vida nos ensinou a viver ao longo dos anos. Não tanto para que ela aprenda a viver como nós, mas - é o que pensamos – para ajudá-la a descobrir as boas coisas da vida, enquanto se busca a reciprocidade, na relação, e a solidariedade, na vida social. Nós, as mulheres da família, gostamos de nos contar os diálogos que temos com Artur e as suas perguntas exigentes. Com as respostas que escuta, ele engendra a sua fonte de informações para explicar os fenômenos da vida e compreender novas noções do seu cotidiano. É um observador perspicaz e tem uma memória que ainda nos surpreende.

Certa vez, antes de completar três anos, alguém lhe trocava a fralda na minha cama. Ao lado, no closet, há um espaço para os seus pertences onde eu peguei lenços umedecidos e um creme contra assaduras. Artur comentou:"Este quarto está todo organizado para coisas de crianças!"

Na minha sala tem uma pequena trepadeira acomodada em uma jarra de ferro. No centro da planta enfiei um cepo pequeno encimado por um pássaro de madeira pintada. Ao lado coloquei uma gaiola no estilo casa, de porta e janela. Certo dia Artur me perguntou para que era aquela casinha. Respondi-lhe o que sempre me pareceu óbvio: era a casa do passarinho que estava na planta. Ele ficou observando, em silêncio, e me disse em seguida: "Essa não é a casa do passarinho, vovó; ele não pode entrar lá dentro, a casa é menor do que o passarinho...".  

O raciocínios de Artur impressionam pela coerência e me fazem rir quando me vejo censurada por minhas explicações distraídas. Há dias atrás, ele brincava de empurrar seus carrinhos, por subidas e descidas montadas com as almofadas do sofá, quando comentei que os motoristas estavam correndo muito. Ele me respondeu, com todas as suas explicações: ‘Esses são só carros de brinquedo, vovó, não tem motorista, sou eu que estou empurrando... Motorista é só de carro grande".


A natureza e seus mistérios já fazem parte do seu mundo imaginário. 

Dia desses estávamos observando, da varanda do apartamento, as estrelas no céu. Foi quando lhe mostrei um satélite (não sei se Júpiter ou Marte), e lhe disse que era o planeta que mais brilha entre as estrelas do céu. Artur me perguntou se havia escada para ir ver as estrelas lá em cima. Fui enfática: 

– Nao tem não, meu filho, nem mesmo avião pode chegar lá. 
– Nem um foguete? – ele retrucou. 
Tive que concordar que um foguete poderia ir até lá, mas fiquei me perguntando onde ele teria sabido da existência de foguetes...


Artur não chegou a conhecer o seu avô materno, pois quando ele nasceu ele estava muito doente e logo depois partiu. 
Ele gosta de ver e rever a fotografia do avô com ele junto ao seu leito, ainda recém-nascido. Sua mãe lhe havia explicado como pôde, a morte do avô.  Dias depois Artur me falou sobre este mistério da vida, como ele havia compreendido: "a pessoa vai crescendo, crescendo, e aí, um dia ela fecha os olhinhos e vai para o céu, morar com as estrelas".


A lua, antes mesmo das estrelas, é o astro mais querido de Artur. Desde cedo ele foi habituado a contemplá-la, da varanda do seu apartamento, de onde observa ora o céu, ora os movimentos do carro do lixo, que acha uma beleza. Ao sair da escola, ao entardecer, em dias de lua ele costuma parar na calçada para observá-la. 

Quando está na varanda comigo e não vê a lua pede para irmos a um dos quartos: - Precisa encontrar a janela certa, para ver a lua vovó!... 


Sua imaginação também transita por paragens não tão românticas. Outro dia a curiosidade me levou a lhe perguntar, assim, de repente: 
- Artuzinho, o que você quer ser quando crescer?
Sem nem pensar e respondeu: - arrombador de cofres!


Na área do bem-querer Artur já entrevê, à sua maneira, algum significado. 
Os livros que lemos são cheios de muitas ilustrações, para os pais e avós, coitados, responderem à tantas perguntas difíceis dessas pequenas criaturas.

Eu peguei para ele as histórias dos clássicos de Grimm, com muitas ilustrações.  Havia a rainha-bruxa que falava com o espelho, a menina perdida na floresta, a casa dos sete anões... E fui lhe contando as histórias com segurança, valendo-me das ilustrações, até o episódio da maçã envenenada, quando Branca de Neve cai num sono profundo. 

A página seguinte era de um príncipe montado no seu magnífico cavalo branco, que acorda Branca de Neve e resolve levá-la consigo.  Contei: aí o príncipe pôs Branca de Neve no seu cavalo branco... E Artur concluiu: e foram namorar!  
Fiquei sabendo, depois, que quando sua mãe sai com o seu pai lhe explica que vão "namorar". E isto ele não esqueceu mais. 

Certo dia eu conversava com minha filha sobre alguma coisa que me comoveu, e cheguei a chorar um pouco. Artur estava conosco. Minha filha me fez um carinho, ele se achegou e me deu um beijo. Ao perceber que as lágrimas continuavam a cair ele voltou, me beijou novamente e falou: Vou te dar três beijinhos, vovó!  Percebi, então, que era hora de sorrir.

O pai de Artur é alto, moreno e usa barba. Para Artur, que herdou a cor branca da mãe, ficar grande é alcançar a estatura e a cor do seu pai: "Quando eu crescer e ficar pretinho, e tiver um bigode e uma barba dos dois lados... eu vou empurrar a bola na rede e fazer gol!"

O interesse de Artur em acompanhar os roteiros de suas idas e vindas de carro, já nos convenceu de que, além de um bom observador ele tem boa orientação. 

Um dia ele passeava com a tia na calçada do edifício onde mora, em Casa Amarela, quando uma senhora os parou e perguntou onde ficava o Mercado de Casa Amarela. Artur interferiu: Casa Amarela é aqui! Minha filha explicou que ela devia pegar a avenida e virar à direita. E Artur, apontando: "a avenida é ali! "

Artur também já começa a engendrar alguma traquinice e usar sua imaginação para conseguir o que deseja. Certo dia elaborou um modo de convencer sua tia a deixá-lo  ficar ajoelhado na sua cadeira do carro, olhando o percurso pelo vidro traseiro: "Meu pai me disse que só hoje eu posso ir de joelho, na cadeirinha...".  Outra vez, brincava de pular na cama de casal, sob os cuidados do pai, quando a sua tia chegou para levá-lo a passeio. Ele gosta muito de ir à Livraria, onde escolhe os seus livros e brinca à vontade. No percurso sua tia lhe explicou que estavam indo à livraria. Ele, então, respondeu, sem interromper a brincadeira: "Hoje não estou com vontade de ler, titia".

Como toda criança da sua idade Artur gosta de inventar brincadeiras utilizando os móveis da casa. Ao ver o desenho da montanha onde o príncipe encontrou Branca de Neve, expliquei que há montanhas bem altas, onde só os adultos podem chegar, e que de lá eles podem observar o abismo, lá em baixo, cheio de pedras... Artur, então, subiu no sofá – com a anuência da avó – olhou lá de cima o abismo e pediu para que eu espalhasse as pedras (de papel) que ele havia preparado. É muito bom ver a sua alegria! 

Seu interesse mais recente é reconhecer as letras do seu nome e do nome dos pais. Perguntei-lhe, então, se ele já sabia ler o seu nome, ao que ele respondeu pronunciando devagar e apontando com o dedo, como se estivesse lendo: Ar...tur. Depois, fez um gesto de junção das duas sílabas, desenhando um meio círculo com a mão espalmada, e disse rápido: Artur! 

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Crédito Imagens:

1. Foto de Artur - arquivo privado
2. Outras imagens - www.canstockphoto.com.br


Nota:  As  imagens  publicadas  neste  blog  pertencem aos seus autores. Se alguém possui os direitos de uma delas, e deseja que  seja removida deste espaço,  por favor faça um comentário nesta postagem.

MEMÓRIAS DO PÔR DO SOL

09 março, 2014

  
Conservo, em meus arquivos, raras imagens de pôr do sol, dos já contemplados e de outros que ainda gostaria de ver um dia, como o pôr do sol africano, aqui registrado em um momento de suave beleza. Ainda sonho em um dia poder acompanhar, aqui no Nordeste, o pôr do sol de Timbau do Sul, no Rio Grande do Norte, e contemplar a sua luz cadente, intensa e cálida.  



Da varanda do apartamento onde vivo, ainda é possível acompanhar o nascer do sol, vislumbrado entre os muitos edifícios que hoje me cercam por todo lado. Ao amanhecer, a claridade se expõe devagar e se esparrama em fendas de luz, para vestir a noite em madrugada. Ao  entardecer, do janelão oposto à varanda ocidental, vejo o matiz vibrante de um pôr do sol tropical, em suas irrepetíveis aparições. Assim, dia após dia... 





Tenho o velho hábito de registrar, momentos de contemplação do entardecer, nas andanças que faço para conhecer outros lugares. Recordo a paisagem comovente da minha chegada, à tardinha, ao Mont San Michel, na França, por uma longa e retilínea estrada que nos entrega a estupenda beleza da sua estrutura de pedra, encimada por um castelo que se ergue à beira mar. 






Inesquecível o cair da tarde à margem do Bósforo, em Istambul, ladeado de um casario histórico único, com o revorar de asas brancas sobre suas mansas águas. 







Essas lembranças me ocorreram quando fui conhecer, no litoral paraibano, o pôr do sol da Praia do Jacaré.  Alí é possível contemplar a exuberante  apresentação de um pôr do sol escarlate e radioso, extremamente belo, que exibe bem de perto, por alguns minutos, a passagem da terra à outra margem do universo, quando o sol parece despedir-se do lado em que o observamos. Um momento único em que se contempla entardecer, dia após dia, ao som do baile de Ravel, que ressoa de um barco à margem da praia, no silêncio reverente de turistas emocionados, que batem palmas à despedida da grande estrela. Um grandioso fenômeno da Mãe Terra e do Universo que a acolhe, a nos falar de uma presença maior de energia e vida, que nos assiste desde o amanhecer de cada um de nós, até o momento último do nosso entardecer. 


A natureza ainda  nos oferece  a contemplação  das noites enluaradas. O luar produz emoções motivadas por sua efusiva presença ou pelo encantamento que envolve os enamorados. 

Para mim, o luar - como o pôr do sol -  é um  suave chamado à reflexão sobre o grande mistério do universo, no qual nos  perdemos... Feito uma partícula viva,  a se  mover no  aprendizado permanente da  relação humana,  e dos  seres vivos com a natureza. 

Há dias, porém, que o luar ou o pôr do sol me falam apenas de uma saudade sem nome, de algum momento guardado na memória do afeto, que não se vai.  


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Crédito das imagens :       

Pôr do sol na África - Jonathan Rosemberg - 2009.

Pôr do sol - Praia do Jacaré - Aninha de Freitas.  www.feriasbrasil.com.br          
Pôr do sol - Mont San Michel - Wikipedia      
Pôr do sol - Bósforo, Istambul - Wikipedia
Luar sobre o mar - www.canstockphoto.com.br


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