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LITERATURA-POESIA - MIA COUTO

30 março, 2017

- O que andas a fazer com um caderno?
- Não sei, pai. 
  Escrevo conforme vou sonhando.
- E alguém vai ler isto?
- Talvez. 
  É bom ensinar alguém a sonhar. (i)

Num doce alento, esse diálogo poético, feito um canto lírico de densa vida, chega de muito longe, do lado oriental do continente africano, onde nasceu o grande escritor moçambicano Mia Couto

"O que andas a fazer com um caderno?
Não sei, pai. 
Escrevo conforme vou sonhando."


É também um diálogo que se instala no mistério da poesia e da escrita. O escritor precisa cultivar o sonho, a sua capacidade de criar e de expressar ideias tingidas de arco-íris, luminosas ou tímidas, pessoais e sociais...  Sonhos cidadãos, sonhos de minorias ainda mantidas à margem por uma sociedade que ignora tudo o que é expressão de justiça, liberdade e vida. Sonhos, ainda, dos que não têm ânimo para sonhar, e enterram em si anseios e mágoas, sem nunca os expressar. 
Poderia ser um colóquio que poderia se passar entre esta, que aqui escreve, e os seus leitores:

            - O que estás a escrever neste espaço da web?
          - Não sei, caros amigos. É o desejo de doar o que escrevo... É o que gosto de fazer!

Às vezes tento contar o que aprendo, no dizer ou no viver de outros. Outras vezes ensaio fazer o dom da minha experiência de vida, esperando que seja de serventia... Mas, entendi melhor hoje: é o sonho que me leva a escrever!

E alguém vai ler isto? 

Talvez... Espero que um dia me retorne algum comentário, uma cantiga, uma história... como um dom de reciprocidade: dividir nossos sonhos, contar nossas histórias, ainda que timidamente, é um excelente aprendizado.


Os que leem as postagens deste Espaço Poese, aqui no Brasil e em outros países, são compatrícios brasileiros, portugueses, angolanos, moçambicanos, açorianos, e outros que sabem o idioma português, em diferentes países espalhados nos quatro cantos do mundo. 

É para essas pessoas que compartilho as descobertas importantes feitas ao longo da vida, repasso informações que talvez possam corroborar o seu pensar e o seu viver, conto histórias exemplares,  que podem sugerir um novo passo em direção à vida e à solidariedade.  É também um modo de cooperar para nasçam, vigorem e refloresçam  muitos sonhos entre nós. 

Foi lendo uma crítica do jornalista Wagner Correa de Araújo, a uma peça de teatro inspirada no primeiro romance de Mia Couto, Terra Sonâmbula, que me senti instigada a celebrar, mais uma vez, este grande escritor moçambicano. 

O livro – escreve o jornalista  "mostra uma terra devastada por uma década de guerras civis (1965/75), capazes de tornar todos, vítimas ou carrascos, uma massa humana informe e desmemoriada. E onde, na tragicidade da inexorável predestinação de efeitos ‘sonambulizantes’, a única perspectiva de ‘futuros e felicidades’ seria o visceral mergulho nos sonhos”. (ii)

Refletindo sobre o romance de Mia Couto, fiquei a pensar que a conjuntura brasileira, hoje, também nos leva a contemplar uma paisagem de terra arrasada, pela desastrosa gestão antidemocrática de um governo golpista que se instalou no país com os seus iguais.

Sabemos que hoje, para nós brasileiros, a Esperança que nos resta é a densa reação cidadã  e suas grandes mobilizações em todo o país – a refletir uma vitalidade que se expressa “na triste paisagem da contemporaneidade, olhando a vida pelo sonho com transcendental ousadia, para levantar asas pelo azul.”

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(i)    Terra Sonâmbula é um  premiado romance escrito por Mia Couto, publicado em 1992. Ganhou o Prêmio Nacional de Ficção da Associação dos Escritores Moçambicanos (1995) e foi considerado um dos doze melhores livros africanos do século XX, por um júri criado pela Feira do Livro do Zimbábue

O romance foi reeditado no Brasil pela Companhia das Letras: "é um romance em abismo, escrito numa prosa poética que remete a Guimarães Rosa. Couto se vale também de recursos do realismo animista e da arte narrativa tradicional africana para compor esta bela fábula". 

Primeiro romance de Mia Couto, Terra Sonâmbula é uma verdadeira aula sobre a velha arte de contar histórias. No Moçambique pós-independência, mergulhado em uma devastadora guerra civil, um velho e um menino empreendem uma viagem recheada de fantasias míticas.

Recentemente, em 2016, a UNICAMP incluiu esse romance em sua lista de leituras obrigatórias para os estudantes que vão prestar exames vestibulares. Em 2017, a UFU também o incluiu como leitura obrigatória para o vestibular de inverno da instituição.

A imagem ao lado é da edição portuguesa - Editora Caminho.



(ii) Fonte do textowww.outraspalavras.net/blog/2016/12/14/peca-de-mia-                                   couto-sugere-costuras-de-sonhos-em-terra-morta


Sinópse da edição brasileira de "Terra Sonâmbula" - Ed. Companhia das Letras:

"Um ônibus incendiado em uma estrada poeirenta serve de abrigo ao velho Tuahir e ao menino Muidinga, em fuga da guerra civil devastadora que grassa por toda parte, em Moçambique. Depois de dez anos de guerra anticolonial (1965/1975), o país do sudeste africano viu-se às voltas com um longo e sangrento conflito interno que se estendeu de 1976 a 1992. O veículo está cheio de corpos carbonizados. Mas há também um outro corpo à beira da estrada, junto a uma mala que abriga os 'cadernos de Kindzu', o longo diário do morto em questão. A partir daí, duas histórias são narradas paralelamente - a viagem de Tuahir e Muidinga e, em flashback, o percurso de Kindzu em busca dos naparamas, guerreiros tradicionais, abençoados pelos feiticeiros, que são, aos olhos do garoto, a única esperança contra os senhores da guerra."

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Créditos das Imagens

1. Capa da publicação brasileira - Editora Companhia das Letras.
2. Foto de Mia Couto - www.outraspalavras.net

Nota: As imagens publicadas neste blog pertencem aos seus autores. Se alguém possui os direitos de uma delas e deseja que seja removida deste espaço, por favor entre  em contato comvrblog@hotmail.com 





























































MEMÓRIAS - TEMPOS DE CELEBRAR

22 março, 2017

Há situações das quais se demora a entender o porquê, o sentido que elas carregam no percurso da vida. Feito quando a terra se vê árida,  na proximidade de um rio, sedenta de chuva e de cuidado. 

Meses e meses sem cair um pingo d´água a dessedentá-la, a plantação ressequida, os riachos a minguar dos afluentes aflitos. 

Quando um umbuzeiro se entrega à estiagem, desnudo e seco,  é porque não há mais na terra o que tirar, e o céu insiste na sua limpidez ensolarada, num azul mortal de abandono.

Muitas vezes contemplei paisagem semelhante no Sertão do Moxotó, e também à beira do São Francisco. Como agora. A expectativa das águas de março, a fechar o verão, é a esperança última de um chão em agonia no grande Sertão.  

Há algum tempo não visito minha terra natal, e vivo nas vizinhanças dos arrecifes banhados pelo Capibaribe. Distanciei-me dos pesares da seca e das alegrias das chuvas de São José e do São João. 


Uma recente experiência pessoal me trouxe não diria a tristeza braba da paisagem da seca, mas a nostalgia transmitida por um vazio arrasador na pequena paisagem da minha janela. 

Estava habituada a contemplar as minhas plantas, dia após dia, na ampla sacada do quarto. Ali, plantei e vi crescer uma vasta trepadeira de buganvília, com seus cachos lilases, ao lado de uma planta de folhas miúdas encantadoras.





A elas se ajuntara um grande pé de jasmim brilhante e viçoso, que me oferecia o perfume de suas brancas flores até dentro do quarto. As ramas da buganvília, de tão exuberantes, entravam pela janela do banheiro, enfeitando-a de cor e beleza.



Mas, chegou o dia em que foi necessário fazer uma poda radical, para desobstruir os canos entupidos pelas raízes de tanta flora. Então, percebi a perda de algo que, - nesse tempo da velhice - tornara-se parte de minha vida como coisa muito amada. E me ressenti como se fora a secura do Sertão. 



Para coroar minhas emoções, uma trepadeira da família alamanda, - que se expandia vigorosa no canto da sacada - surpreendeu-me com uma flor amarela, delicada e única, a coroar a despedida do meu jardim, com sua beleza.

Uma ocasião para descobrir, mais uma vez, que certas perdas e as súbitas mudanças, na vida, podem sugerir a oportunidade de novas potencialidades. 

A buganvília poderá ressuscitar numa grande jarra da varanda. A planta de folhas miúdas poderá brincar de cor e beleza ao seu lado. As raízes da alamanda foram transplantadas, e estão a exigir outro tempo de espera para que eu me surpreenda, quando a flor amarela entender que será novo tempo de celebrar. 


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Crédito das imagens:

1. Umbuzeiro ressequido - arquivo privado do blog.
2. Buganvília - https://pixbay.com/pt/photo/buganvílias.
3. Rama da buganvília entrando pela janela... - arquivo privado do blog.
3. Alamanda amarela em flor - arquivo privado de imagens.

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POESIA - A SOMBRA E A LUZ

16 março, 2017





Vão-se as ventanias e movem-se as águas
Toda força do mar vem da Mãe Terra!
Dia e noite se embalam, e giram e giram...
O sol se encobre... E a noite se revela.






Vão-se as águas gasosas para o céu
Formando bolhas pra dormir estrelas...
A lua chega clareando a noite! 
E a terra se engravida em doce luz!










O tempo corre e veloz se esvai...
A fauna, a flora e humanas criaturas
Descobrem, no amor, o dom da Vida!

A sombra e a luz ... 
E a terna Esperança
A fluir e a maturar nas desventuras.
Que dom, oh Deus, te faço dessa lida?





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* Poema de Vanise Rezende - www.vaniserezende.com.br


Crédito das Imagens:

- Imagem 1 e 2 = www.canstockphoto.com.br
- Imagem 3 = pintura de Claude Monnet - divulgação.


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LA VECCHIAIA E I SOGNI

13 março, 2017


Ho ricevuto un video in cui delle vecchie donne, molto eleganti, parlano su quello che farebbero se oggi tornassero alla  giovinezza. Cose belle, dicono loro, e sognano, lasciandoci capire che avrebbero vissuto diversamente, oggi, quello che allora hanno vissuto.

Mi sono messa a pensare quel che avrei detto se qualcuno mi domandassi la stessa cosa. Ed ho subito compreso che sarei tornata alla mia adolescenza intera – e a tutta la gioventù che ho lasciata indietro nel volo degli anni – rivivendo giorno a giorno quello che ho fatto allora. Ci sono molti momenti che ricordo vivamente, siano quelli più allegri oppure tristi, e li porto in cuore come un dono prezioso della vita.

Perché mi sento così sicura di ciò? Ho 79 da completare quest´anno. La mia vita non è stata perfetta e neppure gli eventi – nelle sue diverse fasi – sono stati sempre belli, oppure brillanti come forse sarebbe stato possibile viverli. Comunque, so che sono stati momenti da esercitare un apprendistato su quanto avrei affrontato più tarde… Innumeri e sinceri tentativi di aggiustare il vivere ai tanti sogni.

Erano tante di quelle gioie che ancora le rivivo nella memoria radiosa di un tempo fugace! I giochi con altre bambine, alla scuola – oppure davanti a casa mia – erano i momenti più attesi. 

Si giocava all´aperto anche sotto la pioggerella… E si giocavano pure le emozioni di correre dentro un sacco, le une accanto alle altre, di saltare con la corda in su e giù, di cantare e danzare in circolo…
 
I maschi ora si stavano ai nostri giochi ora facevano da sé, a seconda del momento. Persino i brevi tempi di quando la mamma mi prendeva a sculacciata, mi viene in mente quale un apprendistato di intrepidezza, a presentarle le mani stese, ferme, senza voler farla vedermi le lacrime.

Ester, la mamma, era una donna soave e piena di cure. E specialmente forte, a governare quella casa lunga e spaziosa ed a guardare sete figli. 

Poi, uno alla volta è stato portato – le quattro donne e i due fratelli maschi (perché uno se ne è andato presto) – a vivere nell´internato, fuori della nostra città. 

Erano i tempi in cui per studiare all´università era necessario essere benestanti (un po' quasi come ci si trova ora, in Brasile, se le cose continueranno come pretende un governo illegale e temerario).  

Ai quindici anni ho fatto la scoperta dell´Azione Cattolica, un movimento di origine francese che ha avuto grande influenza nella vita dei giovani, dagli anni sessanta fino alla dittatura militare. Sono stati gli amici della Azione Cattolica che mi hanno persuaso a studiare a Recife, ospite in una pensione per giovane universitarie.

Più tarde ho fatto la difficile scelta tra un´amore adolescente – che maturava nel desiderio di formare una famiglia – e una vocazione natta dalla spiritualità disseminata da Chiara Lubich (*), che mi ha fatto trovare una famiglia più grande, sparsa in tutto il mondo, nell´intento di lavorare per l´unità di tutti. Così ho fatto le mie scelte e dopo un congresso, in Europa, promosso dal Movimento dei Focolari, ho deciso di rimanervi, trovandomi una borsa di studio a Roma.
  
Quante volte ho vacillato, altrettante mi sono fuorviata. 

Gli sbagli? Un passo per un migliore apprendistato, o per rinnovare la scelta.   

Oggi  ancora cerco di imparare, specialmente dai più giovani, dalle figlie che amo tanto, dagli amici indispensabili. Così mi trovo a rivisitare la vita ed i sogni che non scarseggiano mai. Si, i sogni continuano ad insistere in ricerca di una vita più serena, più semplificata, e più sobria. E nel lavoro per il dialogo e il bene comune.

Percepisco che la vita non lascia di chiedermi nuovi passi, perché dalla sua Fonte ho ricevuto una misura piena e trasbordante.





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 (*) Cf. www.movimentodosfocolares.org



Crediti immagine:

1
. Achivio privato – immagine del blog.
2. Giocchi dell´infanzia - www.rioeduca.net
3. L´internato –  www.istoe.com.br/10308/aulas+de+intolerancia...
4. Passeggio sugli alberi… a 71 anni - Campos de Jordão - São Paulo - Brasile. 

Nota:  Le immagine qui pubblicate hanno i suoi autori. Se qualcuno possiede i diritti di una di queste e desidera che sia rimossa da questo spazio, per favore si diriga a : vrblog@hotmail.com

DIA INTERNACIONAL DA MULHER

08 março, 2017




Dia de todas as mulheres, com suas variações de jeitos de ser, cores de pele, crença, vestuário e costumes: suas burcas, sua nudez, suas roupas esvoaçantes e coloridas, seus cabelos presos ou soltos ou encobertos... Suas belezas de tantas expressões, seus amores, seus sonhos políticos, criativos, inclusivos, empreendedores e poéticos. 

Mulheres pé-no-chão, mulheres inteligentes e fortes, mulheres práticas, leves, românticas. Mulheres sedutoras ou contidas, mulheres livres, prisioneiras, mães, meninas, índias, mulatas, pretas e brancas, cheias de sentimento e ternura e coragem e poder e ardor... Todas as mulheres.




A todas elas - em vários países e culturas do mundo inteiro - e aos seus companheiros e companheiras, filhos e filhas, amigos e amigas, um convite, hoje, a focar o seu olhar sobre um país do mundo cuja beleza é mundialmente reconhecida: num imenso contorno de terras destacadas da África, separado e unido pelo Oceano Atlântico, por suas histórias e pela negritude de suas origens. 

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Um olhar crítico sobre o Brasil. Sobre um povo que se orgulhava de ser um país dito do Futuro, da Riqueza, da Esperança. Agora "é um país falido". O próprio feiticeiro que partilhou do feitiço - a TV Globo - anuncia dados do PIB a demonstrar que "o governo, as empresas e as famílias estão endividados". E afirma que "estamos voltando aos índices da recessão de `89 e´92" (Jornal Globo à tarde de hoje, dia 08.03.2017). Um país da temeridade e do vexame de apresentar taxas que chegam a 14% de desemprego. Um país em que "desde 1948 não via dois resultados negativos e sucessivos do PIB, apresentando queda em todos os setores". Apenas o agronegócio - diz o jornal de TV citado - deu sinais de recuperação nos índices do trimestre final de 2016.  



Mas há outros sinais cruéis de preocupação. O Brasil não tem dado importância à presença organizada de dois grandes povos que integram a sua população: os povos indígenas e sua imensa população negra.  

Alegra-nos observar que é também essa delicada situação do país que está a promover o fortalecimento de organizações específicas de lutas. Hoje, por exemplo, temos um sábio e incisivo manifesto do Movimento Uneafro Brasil, assinado por sua coordenadora, a advogada Rosângela Martins. O movimento é representativo de  significativa expressão das mulheres negras brasileiras e, portanto, também das "mães de meninos e jovens pretos e pobres". Uma população, esta, que precisa enfrentar as maldades e a violência das atuais políticas de um poder ilegal e inconsequente. Abaixo, o manifesto: o negrito do texto assinado é nosso.

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* Texto de Vanise Rezende - Atualizado em 9/03/2017.




Nós militantes feministas negras, estamos com nossas bandeiras empunhadas, nossas faixas, nossos batuques, para que nossas vozes possam ecoar pelas ruas das cidades. O 8 de março é uma data de extrema importância para o movimento de mulheres, e este ano, em especial, corresponde a um chamado de paralisação internacional ou greve geral das mulheres.  Por óbvio, não podemos perder de vista o fato de que no Brasil, vivenciamos um golpe político com a clara intenção de promover uma deliberada retirada de direitos conquistados a duras penas. O mais triste é ver o quanto isso reflete na vida das mulheres negras. Motivo que nos leva a parar.
As mães negras, que choram a perda de seus filhos por conta da violência policial, verdadeiro genocídio da juventude preta no Brasil  estão em luta. 

Insiro, aqui, dados  do "Mapa da Violência - 2016 (*) como ilustração da dolorosa realidade de que fala o manifesto do Movimento Uneafro. Trata-se de um texto copiado de: esquerda online.com.br/2016/8/26 - mapadaviolencia-2016
"A raça, o gênero e a idade das vítimas
A maioria das vítimas de homicídios por arma de fogo continua sendo formada por homens jovens e negros. Parece clichê, mas a pesquisa demonstrou que a premissa é verdadeira.
Nacionalmente, 94,4% das vítimas, em 2014, foram homens. Esse número, se analisado especificamente, variou entre 91% e 96% em cada estado.
Ainda, o crescimento do número de mortes na juventudefaixa etária de 15 a 29 anos, foi bem mais violento do que no restante da população. Enquanto no conjunto da sociedade, o crescimento de homicídios por arma de fogo cresceu 592,8% no período compreendido entre 1980 e 2014, dentre os jovens o número subiu para 699,5% ". 
É notável que a mulher negra será o principal alvo a ser atingido com a prometida reforma da Previdência Social. Já no campo da Educação, setor composto por uma maioria de mulheres, o enorme impacto implicará na desqualificação do já sofrível ensino público, sucateado há muito tempo. Mas será que todas nós conseguiremos parar?

Imagine um dia totalmente paralisado pelas mulheres. Um dia em que a trabalhadora do lar, ciente de que está ameaçado o seu direito à aposentadoria, por todos os anos em que manteve a dinâmica de uma casa, e sem remuneração, deixasse de preparar a alimentação, lavar as roupas das pessoas que ali vivem, levar seus filhos à escola…

Um dia em que as professoras decidissem abandonar a sala de aula para lecionar nas ruas, invocando seus direitos pela valorização da categoria, pela não redução de seus salários, contra a reforma da educação que elimina matérias de suma importância para a formação de todas nós…
Um dia em que nossas jovens, nossas filhas, que almejam mais do que um diploma de ensino médio, que desejam chegar à universidade e encarar profissões desafiadoras, a partir de oportunidades igualitárias, também parassem...




Um dia em que parassem também as trabalhadoras terceirizadas, em sua maioria negra, que limpam as escolas, preparam as merendas, estão no telemarketing, submetidas a empregadores que mais violam os seus direitos pagando cada vez menos, e exigindo cada vez mais…

Um dia em que as empregadas domésticas, que demoraram anos para terem seus direitos trabalhistas reconhecidos, e agora, diante da reforma da previdência veem a aposentadoria como algo inalcançável, cruzassem seus braços…

Talvez não alcancemos o todo da massa feminina brasileira já neste dia 8, mas está evidente a potência mobilizadora da luta das mulheres em todo o mundo.

Nossas irmãs, que rompem com o silêncio, com relacionamentos abusivos e violentos, refazem a vida, reconstroem sua história, sua autoestima, sua luta, e gritam para que não sejam mais um número de vítimas do feminicídio, estão em luta.

As mães negras, que choram a perda de seus filhos e filhas por conta da violência policial, verdadeiro genocídio da juventude preta, e ainda, as que enfrentam uma “via crucis” para que seu filho, companheiro, pai, irmão, sobrevivam apesar de um sistema penal seletivo que encarcera pretos de forma massiva, estão em luta.

Somos essas mulheres. Por todas elas e por todas nós, paramos.

Juntas, somos muitas. Juntas, venceremos!

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* Rosângela Martins é advogada, feminista negra e coordenadora nacional do movimento Uneafro-Brasil .     
Postado originalmente no blog: http://negrobelchior.cartacapital.com.br/por-um-8-de-marco-de-mulheres-pretas-pobres-e-perifericas/

Créditos das Imagens

1. Sibila Délfica - Michelangelo - Capela Sistina - In: Bol.Notícias.Uol -         Os tesouros do Vaticano.
2. Manifestação da União Brasileira da Mulher no dia 8/03/2016, em         comemoração dos cem anos do Dia Internacinal da Mulher. 
3. Rosto de índia amazonas, divulgado pela Avaaz.
4. Detalhe do manifesto do Movimento Uneafro, em foto que ilustra o     texto original publicado no Blog Negro Belchior.
5. Imagem de manifestação em Maringá-SC contra a Reforma da             Previdência Social - g1.globo.com/politicas/cidades-tem-protestos...
6. Retrato de Chiquinha Gonzaga, musicista que apoiou a liberdade dos     escravos negros no Brasil. 
7. Margarida Alves, sindicalista negra assassinada em 1983.
8. Atuação violenta da polícia: Mapa da Violência - foto ilustrativa do         texto de Paulo Nunes, São Paulo - SP.
    
Nota: As imagens publicadas neste blog pertencem aos seus autores. Se alguém possui os direitos de uma delas e deseja que seja removida deste espaço, por favor entre  em contato com vrblog@hotmail.com 





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