Escrevo conforme vou sonhando.
- E alguém vai ler isto?
- Talvez.
É bom ensinar alguém a sonhar. (i)
- Talvez.
É bom ensinar alguém a sonhar. (i)
Num doce alento, esse diálogo poético, feito um canto lírico de densa vida, chega de muito longe, do lado oriental do continente africano, onde nasceu o grande escritor moçambicano Mia
Couto.
"O que andas a fazer com um caderno?
Não sei, pai.
Escrevo conforme vou sonhando."
É também um diálogo que se instala no mistério da poesia e da escrita. O escritor precisa cultivar o sonho, a sua capacidade de criar e de expressar ideias tingidas de arco-íris, luminosas ou tímidas, pessoais e
sociais... Sonhos cidadãos, sonhos de minorias ainda mantidas à margem por uma sociedade que ignora tudo o que é expressão de justiça, liberdade e vida. Sonhos, ainda, dos que
não têm ânimo para sonhar, e enterram em si anseios e mágoas, sem nunca os
expressar.
Poderia ser um colóquio que poderia se passar entre esta, que aqui escreve, e os seus leitores:
- O que estás a escrever neste espaço da web?
- Não sei, caros amigos. É o desejo de doar o que escrevo... É o que gosto de fazer!
Às vezes tento
contar o que aprendo, no dizer ou no viver de outros. Outras vezes ensaio fazer o dom da minha experiência de vida, esperando que seja de serventia... Mas, entendi melhor hoje: é o sonho que me leva a escrever!
E alguém vai ler isto?
Talvez... Espero que um dia me retorne algum comentário, uma cantiga, uma história... como um dom de reciprocidade: dividir nossos sonhos, contar nossas histórias, ainda que timidamente, é um excelente aprendizado.
Os que leem as postagens deste Espaço Poese, aqui no Brasil e em
outros países, são compatrícios brasileiros, portugueses, angolanos, moçambicanos, açorianos, e outros que sabem o idioma português, em diferentes países espalhados nos
quatro cantos do mundo.
É para essas pessoas que compartilho as descobertas importantes feitas ao longo da vida, repasso informações que talvez possam corroborar o seu pensar e o seu viver, conto histórias exemplares, que podem sugerir um novo passo em direção à vida e à solidariedade. É também um modo de cooperar para nasçam, vigorem e refloresçam muitos sonhos entre nós.
É para essas pessoas que compartilho as descobertas importantes feitas ao longo da vida, repasso informações que talvez possam corroborar o seu pensar e o seu viver, conto histórias exemplares, que podem sugerir um novo passo em direção à vida e à solidariedade. É também um modo de cooperar para nasçam, vigorem e refloresçam muitos sonhos entre nós.
Foi lendo uma crítica do jornalista Wagner Correa de Araújo, a uma peça de teatro inspirada no primeiro romance de Mia Couto, Terra Sonâmbula, que me senti instigada a celebrar, mais uma vez, este grande escritor moçambicano.
O livro – escreve o jornalista – "mostra uma terra
devastada por uma década de guerras civis (1965/75), capazes de tornar todos,
vítimas ou carrascos, uma massa humana informe e desmemoriada. E onde, na
tragicidade da inexorável predestinação de efeitos ‘sonambulizantes’, a única
perspectiva de ‘futuros e felicidades’ seria o visceral mergulho nos sonhos”. (ii)
Refletindo sobre o romance de Mia Couto, fiquei a pensar que a conjuntura brasileira, hoje, também
nos leva a contemplar uma paisagem de terra arrasada, pela desastrosa gestão antidemocrática de um governo golpista que se instalou no país com os seus iguais.
Sabemos que hoje, para nós brasileiros, a Esperança que nos resta é a densa reação cidadã – e suas grandes mobilizações em todo o país – a refletir uma vitalidade que se expressa “na triste paisagem da contemporaneidade, olhando a vida pelo sonho com transcendental ousadia, para levantar asas pelo azul.”
-------------------------------------------
Sabemos que hoje, para nós brasileiros, a Esperança que nos resta é a densa reação cidadã – e suas grandes mobilizações em todo o país – a refletir uma vitalidade que se expressa “na triste paisagem da contemporaneidade, olhando a vida pelo sonho com transcendental ousadia, para levantar asas pelo azul.”
-------------------------------------------
Citações publicadas em 14
de dezembro de 2016 por Antonio Martins: http://outraspalavras.net/blog/2016/12/14/peca-de-mia-couto-
(i) Terra Sonâmbula é um premiado romance escrito por Mia Couto, publicado em 1992. Ganhou o Prêmio Nacional de Ficção da Associação dos Escritores Moçambicanos (1995) e foi considerado um dos doze melhores livros africanos do século XX, por um júri criado pela Feira do Livro do Zimbábue.
O romance foi reeditado no Brasil pela Companhia das Letras: "é um romance em abismo, escrito numa prosa poética que remete a Guimarães Rosa. Couto se vale também de recursos do realismo animista e da arte narrativa tradicional africana para compor esta bela fábula".
Primeiro romance de Mia Couto, Terra Sonâmbula é uma verdadeira aula sobre a velha arte de contar histórias. No Moçambique pós-independência, mergulhado em uma devastadora guerra civil, um velho e um menino empreendem uma viagem recheada de fantasias míticas.
Recentemente, em 2016, a UNICAMP incluiu esse romance em sua lista de leituras obrigatórias para os estudantes que vão prestar exames vestibulares. Em 2017, a UFU também o incluiu como leitura obrigatória para o vestibular de inverno da instituição.
A imagem ao lado é da edição portuguesa - Editora Caminho.
O romance foi reeditado no Brasil pela Companhia das Letras: "é um romance em abismo, escrito numa prosa poética que remete a Guimarães Rosa. Couto se vale também de recursos do realismo animista e da arte narrativa tradicional africana para compor esta bela fábula".
Primeiro romance de Mia Couto, Terra Sonâmbula é uma verdadeira aula sobre a velha arte de contar histórias. No Moçambique pós-independência, mergulhado em uma devastadora guerra civil, um velho e um menino empreendem uma viagem recheada de fantasias míticas.
Recentemente, em 2016, a UNICAMP incluiu esse romance em sua lista de leituras obrigatórias para os estudantes que vão prestar exames vestibulares. Em 2017, a UFU também o incluiu como leitura obrigatória para o vestibular de inverno da instituição.
A imagem ao lado é da edição portuguesa - Editora Caminho.
(ii) Fonte do texto: www.outraspalavras.net/blog/2016/12/14/peca-de-mia- couto-sugere-costuras-de-sonhos-em-terra-morta
"Um ônibus incendiado em uma estrada poeirenta serve de abrigo ao velho Tuahir e ao menino Muidinga, em fuga da guerra civil devastadora que grassa por toda parte, em Moçambique. Depois de dez anos de guerra anticolonial (1965/1975), o país do sudeste africano viu-se às voltas com um longo e sangrento conflito interno que se estendeu de 1976 a 1992. O veículo está cheio de corpos carbonizados. Mas há também um outro corpo à beira da estrada, junto a uma mala que abriga os 'cadernos de Kindzu', o longo diário do morto em questão. A partir daí, duas histórias são narradas paralelamente - a viagem de Tuahir e Muidinga e, em flashback, o percurso de Kindzu em busca dos naparamas, guerreiros tradicionais, abençoados pelos feiticeiros, que são, aos olhos do garoto, a única esperança contra os senhores da guerra."
-------------------------------------
Créditos das Imagens
1. Capa da publicação brasileira - Editora Companhia das Letras.
2. Foto de Mia Couto - www.outraspalavras.net
Nota: As imagens publicadas neste blog pertencem aos seus autores. Se alguém possui os direitos de uma delas e deseja que seja removida deste espaço, por favor entre em contato comvrblog@hotmail.com
1. Capa da publicação brasileira - Editora Companhia das Letras.
Nota: As imagens publicadas neste blog pertencem aos seus autores. Se alguém possui os direitos de uma delas e deseja que seja removida deste espaço, por favor entre em contato comvrblog@hotmail.com