Vanise Rezende - clique para ver seu perfil

RESPOSTAS DA MÃE TERRA

04 março, 2015


Mais uma vez, trago a palavra e a visão carismática de Leonardo Boff sobre a situação em que, lamentavelmente, estamos deixando a Mãe Terra. Lendo-o, parece-me ouvir a voz dos profetas do Antigo Testamento, anunciando que Deus não está satisfeito com o modo como a estamos tratando. Pois a Terra foi entregue aos cuidados da Natureza, dos homens e dos animais para que nos oferecesse vida, e vida em abundância. Segue o artigo.


Mais que no âmago de uma crise de proporções planetárias, nos confrontamos hoje com um processo de irreversibilidade. A Terra nunca mais será a mesma. Ela foi transformada em sua base físico-química-ecológica de forma tão profunda que acabou perdendo seu equilíbrio interno. Entrou num processo de caos, vale dizer, perdeu sua sustentabilidade e afetou a continuação do que, por milênios, vinha fazendo: produzindo e reproduzindo vida.
Todo caos possui dois lados: um destrutivo e outro criativo. O destrutivo representa a desmontagem de um tipo de equilíbrio que implica a erosão de parte da biodiversidade e, no limite, a diminuição da espécie humana. Esta resulta ou por incapacidade de se adaptar à nova situação ou por não conseguir mitigar os seus efeitos letais. Concluído esse processo de purificação, o caos começa a mostrar sua face generativa. Cria novas ordens, equilibra os climas e permite aos seres humanos sobreviventes construírem outro tipo de civilização.

Da história da Terra aprendemos que ela passou por cerca de quinze grandes dizimações, como a do cambriano, há 480 milhões de anos, que dizimou 80-90% das espécies. Mas, por ser mãe generosa, lentamente, refez a diversidade da vida.

Hoje, a comunidade científica, em sua grande maioria, nos alerta  face a um eventual colapso do sistema-vida, ameaçando o próprio futuro da espécie humana. Todos podem perceber as mudanças que estão ocorrendo diante de nossos olhos. 




Grandes efeitos extremos: por um lado, estiagens  prolongadas,  associadas à grande escassez de água, afetando os ecossistemas e a sociedade como um todo, como está ocorrendo no sudeste de nosso país. Em outros lugares do planeta, como nos USA, invernos rigorosos como não se viam há decênios ou até centenas de anos.
O fato é que tocamos nos limites físicos do planeta Terra. Ao forçá-los, como o faz a nossa voracidade produtivista e consumista, a Terra responde com tufões, tsunamis, enchentes devastadoras, terremotos e uma incontida subida do aquecimento global. Se chegarmos a um aumento de dois graus Celsius de calor, a situação é ainda administrável. 

Caso não fizermos a lição de casa, ao diminuirmos drasticamente a emissão de gases de efeito estufa, e não reorientarmos nossa relação para com a natureza na direção da autocontenção coletiva e do respeito aos limites de suportabilidade de cada ecossistema, então prevê-se que o clima pode se elevar a quatro e até seis graus Celsius. Aí conheceremos a “tribulação da desolação” para usarmos uma expressão bíblica, e grande parte das formas de vida que conhecemos não irão subsistir, inclusive porções da humanidade.

A renomada revista Science de 15 de janeiro de 2015 publicou um trabalho de 18 cientistas sobre os limites planetários (Planetary Bounderies: Guiding human development on a changing Planet). Identificaram nove dimensões fundamentais para a continuidade da vida e de nosso ensaio civilizatório. Vale a pena citá-las: (1) mudanças climáticas; (2) mudança na integridade da biosfera com a erosão da biodiversidade e a extinção acelerada de espécies; (3) diminuição da camada de ozônio estratosférico que nos protege de raios solares letais; (4) crescente acidificação dos oceanos; (5) desarranjos nos fluxos biogeoquímicos (ciclos de fósforo e de nitrogênio, fundamentais para a vida); (6) mudanças no uso dos solos como o desmatamento e a desertificação crescente; (7) escassez ameaçadora de água doce; (8) concentração de aerossóis na atmosfera (partículas microscópicas que afetam o clima e os seres vivos); (9) introdução de agentes químicos sintéticos, de materiais radioativos e de nanomateriais que ameaçam a vida.
Destas nove dimensões, as quatro primeiras já ultrapassaram seus limites e as demais se encontram em elevado grau de degeneração. Esta sistemática guerra contra Gaia pode levá-la a um colapso como ocorre com as pessoas.

E apesar deste cenário dramático, olho em minha volta e vejo extasiado a floresta cheia de quaresmeiras roxas, fedegosos amarelos e no canto de minha casa as “belle donne” floridas, tucanos que pousam em árvores em frente de minha janela e as araras que fazem ninhos debaixo do telhado.


Então me dou conta  de  que a Terra é  de  fato  mãe  generosa: às nossas agressões ainda nos sorri com flora e fauna. E nos infunde a esperança de que não o apocalipse, mas um novo gênesis está a caminho. A Terra vai ainda sobreviver. Como asseguram as Escrituras judeu-cristãs: “Deus é o soberano amante da vida” (Sab 11,26). E não permitirá que a vida que, penosamente, superou o caos, venha a desaparecer.

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  • Leonardo Boff é colunista do JBonline, filósofo, teólogo e escritor.
  • A presente crônica foi publicado no blog de Leonardo Boff, em 22/02/2015; os grifos são nossos.

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Crédito das imagens

Mar Morto - divulgação viagens.

Flor no gelo - canstockphoto.
Imagem da terra - divulgação NASA.
Seca e Cheia em Pernambuco - JConline.NE10.uol.com.br - Galeria Imagens.
Quaresmeira roxa - www.umpedeque.com.br
Fedegoso amarelo - http://chabeneficios.com.br



Para entender melhor:


Sobre o nome Gaia, dado ao planeta terra: Na mitologia grega, Gaia é o nome da deusa da Terra, companheira de Urano (Céu) e mãe dos Titãs (gigantes). Gaia é a personificação do planeta Terra, representada como uma mulher gigantesca e poderosa. Em homenagem à deusa grega, a Teoria de Gaia (também conhecida como Hipótese de Gaia) foi criada pelo cientista britânico James E. Lovelock. Nela o cientista descreve o planeta Terra como um organismo vivo, que apresenta algumas características como a atmosfera com química e a capacidade para manter e alterar suas condições ambientais - o que não acontece com outros planetas do sistema solar”.
                                                            www.significados.com.br).







Sobre o Sistema Cambriano -  Sistema mais inferior do erátema Paleozoico. Na cronologia geológica, diz-se do período durante o qual as rochas desse sistema foram formadas, equivalente ao intervalo de tempo geológico compreendido aproximadamente entre 570 e 510 milhões de anos. (Do dicionário Houaiss, 2ª acepção do verbete "cambriano").
Ao lado, a gravura de um olenoides serratus (Trilobite de 10cm) em Burgess Shale.                                                                                                                                



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